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SÁBADO, 23 DE NOVEMBRO DE 2024
05 de FEVEREIRO de 2020 | Fonte: BBC News Brasil

Funai suspende atendimento e famílias indígenas passam fome em Mato Grosso do Sul

A comunidade, que fica na fronteira do Brasil com o Paraguai, está passando necessidade sem os alimentos que eram entregues pelo governo federal.
As 64 famílias da Pyelito Kue (foto) estão sem receber alimentos desde o começo do mês (Foto: Procuradoria da República em Mato Grosso Do Sul)

Solano Lopes, de 51 anos, é o líder da terra indígena Pyelito Kue, um território no município de Iguatemi (MS), a 470 quilômetros da capital, Campo Grande. Desde o início do ano, disse ele, as 64 famílias da etnia guarani-kaiowá que moram no local não recebem mais as cestas de alimentos que eram entregues com o apoio da Fundação Nacional do Índio (Funai).

 

A comunidade, que fica na fronteira do Brasil com o Paraguai, "está passando muita necessidade" sem os alimentos que eram entregues pelo governo federal, disse Solano.

 

"Para a gente ter alimentação, a gente tem que plantar alguma coisa (...). As nossas áreas são 97 hectares. É muito pequeno (...). Eles [os indígenas] reclamam comigo que a área é muito pequena". disse.

 

A área onde o grupo vive "é o nosso tekohá [o termo em guarani significa aldeia, território]. Só que falta expandir", disse Solano.

 

A origem das dificuldades enfrentadas pela comunidade de Solano está bem longe dali, em Brasília. No fim do ano passado, a Fundação Nacional do Índio (Funai) decidiu que não vai mais atender a comunidades indígenas que não vivam em áreas que já tenham sido completamente demarcadas.

 

No caso da comunidade de Solano, isso significa que os servidores da Funai não vão mais até a área acompanhando os caminhões da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) que fazem a distribuição. Sem o apoio da Funai, a empresa pública parou de fazer a distribuição.

 

O papel dos indigenistas, nesse caso, é guiar os caminhoneiros, intermediar o contato com os indígenas (em alguns dos acampamentos os moradores não falam português) e registrar a quantidade de cestas entregues. Assim, sem o apoio da Funai, os alimentos pararam de chegar.

 

Em nota à BBC News Brasil, a Funai disse que não é obrigação sua ajuda na entrega das cestas: há decisão da Justiça (do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, o TRF-3, de agosto de 2018) obrigando a União e o governo de Mato Grosso do Sul a entregar as cestas, mas a Funai não foi incluída no despacho.

 

"A Funai informa que há uma decisão judicial determinando que a entrega de cestas básicas seja realizada pelo governo de Mato Grosso do Sul e pela União, entretanto a Fundação não faz parte da ação", diz a nota.

 

"Há que se esclarecer que não existe relação entre a distribuição de cestas básicas e Terras Indígenas não homologadas em Mato Grosso do Sul. O fornecimento de alimentação pela União a aldeias daquele estado permanece regular", disse o órgão.

 

Também disse que há decisão judicial obrigando a União a entregar os alimentos, mas que essa obrigação não se estende à Fundação — ela não é alvo da decisão judicial.

 

O argumento usado internamente pela Funai, exposto em diversos documentos aos quais a BBC News Brasil teve acesso, é o de que o órgão não pode incentivar a permanência dos indígenas em áreas ocupadas: a ajuda poderia provocar processos contra a União por parte de fazendeiros que foram alvo da ação dos índios, resultando em dano aos cofres públicos.



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